Folk Tale

A Bicha de Sete Cabeças

TitleA Bicha de Sete Cabeças
Book AuthorAdolfo Coelho
Chapter Nr.44
Language codepor

Era uma vez um homem que vivia com uma sua irmã em muito boa amizade; vem uma má d'uma vizinha e disse-lhe: «Você aqui cheiinha de trabalho e seu irmão para ali a comer na venda mais uma amiga.» «Não diga tal; isso é falso.» A vizinha veio para onde ao irmão e encontrou-o a roçar mato e disse-lhe : » Você aqui mortinho de trabalho e sua irmã em casa com um amigo a comer bons bocados.» O irmão chegou a casa; vestiu-se com o fato melhor, pegou n'uma espingarda ás costas e levou três carneiros, três broas de pão e três vinténs em dinheiro, que dinheiro não tinha mais. Pelo caminho pegou nos carneiros e no pão e deu tudo a um pobre que encontrou que era Nosso Senhor e elle lhe fez dos carneiros três cães que filavam a tudo que encontravam. Era muito feliz na caça; todos os caçadores o chamavam para irem à caça com elle.

Um dia chegou a um monte e estava lá uma rapariga e aaaim que o viu disso-lhe: «Fuja, meu tio, que vem lá a bicha do sete cabeças e mata-o.» «Que bicha será essa a que ou não posso atirar?» «É uma bicha que todos os caçadores teem andado a ver se a podem matar e não a matam e ella todos os dias come uma pessoa que vem ao monte, se lhe cae a sorte n'ella. Eu era filha do rei e caiu-me a sorte.» Ello disse: «Não tenho medo; eu hei de matá-la, que trago aqui três cães que filam a tudo.» N'isto chegou a bicha que a duas léguas de distancia já se ouvia rugir.

Chegou a bicha e elle assogou-lhe os cães o matou-a. Depois então a menina disse-lhe: «Venha commigo que ha de ter um grande premio de meu pae, que até disse que se algum homem matasse a bicha me dava a elle em casamento». «Eu agradeço, mas não quero». «Então venha commigo quo meu pae dá-lhe um grande premio». «Eu não preciso de nada.» Ella então tomou um annel douro o deu-lh'o e elle acceitou-o.

O homem foi á bicha e cortou-lhe as linguas das sete cabeças e embrulhou-as no lenço, que metteu no bolso.

Isto constou por toda a parte e como o rei tinha dado a palavra que dava a filha a quem matasse a bicha, um preto que soube d'Í8to foi ao monte, cortou as cabeças á bicha e foi com ellas ao rei, dizendo que tinha morto a bicha e que lhe dósse a filha. «Minha filha não tens remédio senão casar com o preto». «Meu pae quem matou a bicha foi um homem muito bonito que tinha três cães e disse que não queria o premio, nem casar commigo e até eu por lembrança lhe dei o meu annel». «Não tens remédio senão casar com o preto, pois, elle é quem trouxe as cabeças.»

N'isto estava o casamento preparado e o homem que matara a bicha andava no monte á caça com uns caçadores e estos contaram que a filha do rei ia casar com o preto, e disseram: «Que pena aquelle ladrão ir casar com aquella rapariga.» O homem: «Então que casamento é esse?» «Foi um preto que matou a bicha de sete cabeças e o rei tem de dar a filha, como promettera, a quem matasse a bicha. A pobre menina diz que não foi o preto que matou a bicha e todos os dias reza a Santo António que lhe depare o homem que matou a bicha.»

O homem calou-se e ao outro dia caminhou e foi a casa do rei. Chegou lá e disse que queria fallar a sua majestade; o rei, como estava embebido com o casamento do preto, não lhe quiz fallar. O homem repetiu outra vez o pedido e disse que, se elle não lhe queria fallar, que ao menos lhe fallasse a princeza d'uma janella sacada, que elle ia por causa da bicha das sete cabeças. N'isto o rei que soube que o homem que ia lá a troco da bichinha, mandou-lhe dizer que lhe fallava e appareceu mail-a filha e esta apenas lhe botou os olhos disse: «Oh meu pae! aqui está o homem que matou a bicha.» Então disse o rei: «O que me contaes da bicha? Como é que aqui me appareceram as setes cabeças da bicha?» «Como a bicha tinha seto cabeças devia ter sete línguas e ellas aqui estão.» O rei desembrulhou o lenço e viu as linguas; foi ver as cabeças e não lhe viu nenhuma; mandou matar o preto e disse ao que matou a bicha: «Então ahi tendes a minha filha». «Real Senhor, eu agradeço muito; mas não quero casar». «Pois, emfim, pedi o que quizerdes que eu tudo vos dou». «Real Senhor, eu nada preciso que tenho aqui três cães que faço quanto eu quero, entro onde quero, vou onde quero e acabo o que quero.» O rei então deu-lhe uma medalha e as maiores honras da sua corte.


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